terça-feira, 29 de maio de 2012

Contramão





Ouvia os risos que vinham de longe. Antes disso, um silêncio de fazer ouvir suas lágrimas caírem no chão. Os dias eram ruins e de tristezas abissais. Aquele dia era ainda pior. Seu olhar de quem chorou denunciava mais uma vez o fim de seu romance.  Costumava dizer que o romance era dele, pois sua impressão egoísta é que ele era a única pessoa a amar naquela história toda.

Talvez seu modo de amar fosse mais intenso. De fato, era mais intenso. Chegou a se queixar com os amigos dele e dela. Chegou a se queixar com ela que o chamou de egoísta, antes de dizer que ele estava deixando de ser um cara extremante maduro e equilibrado. Por se considerar maduro e muito equilibrado, não disse nada, deixou passar, quis evitar uma discussão séria e desnecessária.

A discussão foi apenas adiada. Brigaram feio, trocaram acusações infantis, ela disse que o amor dele era pouco e se acabou, ele disse que o amor que ela sentia murchou antes das flores que ele deu. Chegaram ao fundo do poço quando ele disse que poderia ser feliz sozinho, que seria melhor do que estar mal acompanhado, todas as palavras duras que se diz em momentos de tensão ou de desequilíbrio e infantilidade.

Essa briga é que o levou a sair de casa e ir para um bar perto de um dos shoppings, onde ele poderia tomar uma cerveja, acompanhar a melancolia do anoitecer, as pessoas fazendo caminhada, os casais que passavam ali perto. Os casais faziam com que ele se lembrasse de seu namoro. Faziam lembrar o quanto foi imaturo e imbecil ao gritar daquele jeito.

Ainda cedo, quando o movimento era pouco e o silêncio reinava, podia ouvir o balanço das águas do rio, temia que suas lágrimas fossem suficientes pra formarem um rio. Depois aumentou movimento, veio barulho dos carros, das risadas de um grupo de adolescentes que estavam do outro lado da avenida.

Entre uma cerveja e outra, a sensação de que nunca esteve tão indefinido. O medo de cair em prantos a qualquer momento tomava conta dele. A vontade de procurá-la, pedir perdão, dizer que não foi por mal, que não aconteceria mais, pensou dizer tanta coisa seguida de um pedido de segunda chance, pela milésima vez. Um pouco de álcool e presença de amigos poderiam acomodar sua solidão. Mas os amigos demoravam chegar. Eram dois de sua extrema confiança.

Lembrou-se que há alguns dias chegou a falar em casamento. Ela ponderou, disse não estar preparada e mais uma vez ele saiu pra se queixar com amigos de sua confiança e dizer que ela não o amava muito e que ele parecia amar sozinho. Muito cheio de egoísmo, sempre. Aos amigos de sua desconfiança não dizia nada de mais, conversava amenidades e cotidianos.

A todo instante pensava no acontecido. E entre um gole e outro, percebia cada vez mais o quanto estava indefinido, inconstante e pensou também que era hora de parar de beber e pensou nos longos meses em que esteve com sua ex, depois sentiu raiva por tudo o que planejaram e não cumpriram, lembrou-se das flores, dos livros, dos telefonemas de madrugada pra dar boa noite e lembrou tanta coisa, do sorriso dissimulado, da gargalhada linda, lembrou-se de tudo e percebeu que vivia demais pra ela, que ligava demais pra ela e pensou que ele era o único a amar em toda aquela história.

Do outro lado do rio, em um barzinho, ela estava com umas amigas, chorando e lembrando-se das vezes em que acordava desesperada pra lhe devolver o ar enquanto ele era dominado por uma asma. Lembrou-se de quando saiu de um cursinho no fim de semana por causa dos ciúmes, de quando ele deixava de sair com ela pra ver futebol ou jogar com os amigos. De como ela aceitava tudo isso sem reclamar.

Percebeu, então, que vivia demais pra ele, que fazia muito por ele, que também o amava demais e se dedicava demais, percebeu que ele não valorizava tanto amor e dedicação, que ele a trocava pelos amigos pra se queixar que ela não queria saber deles dois. Trêmula, levantou a voz pra dizer algumas coisas e foi embora deixando as amigas sozinhas.

P.S.: Todo fim infeliz não deixa de ser um sinal de incompetência.